📜 Formação do Kojiki (古事記の成立)
O livro mais antigo que transmite a história do Japão
(わが国の歴史を伝える最古の書物)
As histórias dos deuses e dos imperadores japoneses foram, por muito tempo, transmitidas oralmente por cantadores e sacerdotes. No entanto, essas tradições orais variavam muito e, com o tempo, se tornaram imprecisas e conflituosas.
⚠️ Para registrar corretamente a história da linhagem imperial, o 40º imperador do Japão, Tenmu (天武天皇), tomou uma decisão importante:
“A tradição passada pelos cantadores não é confiável. Vamos corrigir isso e transmitir a história verdadeira desta nação.”
Assim, em 681 d.C., ele ordenou a compilação oficial de genealogias e registros históricos confiáveis, o que culminou, anos depois, na criação do lendário Kojiki (古事記) – o livro mais antigo do Japão.
🏯 Fortalecendo a autoridade dos deuses e dos imperadores
(神々と天皇の権威を高める)
Essa iniciativa foi motivada não apenas pela preocupação histórica, mas também por uma necessidade política urgente.
📌 Contexto histórico:
Após a morte do imperador anterior, houve um conflito interno pelo trono, conhecido como a Rebelião de Jinshin (壬申の乱). O imperador Tenmu saiu vitorioso, mas a instabilidade ameaçava sua posição.
Para legitimar seu governo, ele buscou reforçar a conexão da casa imperial com os deuses (kami), especialmente com Amaterasu, a deusa do sol e divindade central do xintoísmo.
➡️ O Kojiki cumpriu esse papel ao apresentar os imperadores como descendentes diretos dos deuses, estabelecendo uma autoridade divina sobre o trono.
🧠 Curiosidade:
Essa estratégia foi também usada séculos depois no Nihon Shoki (日本書紀), uma crônica mais elaborada e voltada ao público estrangeiro, especialmente a China e a Coreia.
📚 Estrutura do Kojiki
Composto por três volumes e repleto de mitologia
(上・中・下巻から成り 神話の比率が高いのが特徴)
O Kojiki é dividido em três volumes:
📖 Volume Superior (上巻 – Jōkan)
- Trata das origens mitológicas do mundo e da criação do Japão.
- Apresenta deuses como Izanagi, Izanami, Amaterasu, Susanoo e muitos outros.
- Foca na criação do mundo e na fundação espiritual da nação.
✨ Curiosidade:
Cerca de um terço do conteúdo do Kojiki é mitológico, o que o torna uma das obras mais importantes da literatura xintoísta.
📖 Volume Médio (中巻 – Chūkan)
- Narra os feitos de imperadores lendários, especialmente do Imperador Jinmu, considerado o primeiro imperador humano.
- Mostra como os descendentes dos deuses começaram a reinar sobre a terra, fundando a casa imperial.
⚔️ Destaque:
Personagens como Yamato Takeru, o herói guerreiro, surgem nesse volume com relatos épicos de batalhas e conquistas.
📖 Volume Inferior (下巻 – Gekan)
- Cobre a história dos imperadores do século V ao século VII, até o reinado da Imperatriz Suiko (33ª soberana).
- Inclui registros mais realistas, mas ainda com elementos lendários e disputas de sucessão.
🧾 Importância histórica:
Esse volume serviu como documento oficial da linhagem imperial, sendo usado para justificar o direito ao trono em épocas de crise.
🎌 Por que o Kojiki é tão importante?
- É o registro mais antigo do Japão, compilado em 712 d.C. por Ō no Yasumaro (太安万侶), com base na recitação de Hieda no Are (稗田阿礼).
- Marca o início da historiografia japonesa e da identidade mitológica e política do país.
- É essencial para o xintoísmo, a religião nativa do Japão, pois apresenta a genealogia dos kami (deuses) e sua relação com os imperadores.
📘 Kojiki – Volume Superior (上巻)
🌏 A história do nascimento do Japão, a terra onde habitam os deuses
O Kojiki não é apenas um registro histórico comum. Ele está repleto de episódios misteriosos e simbólicos, como:
- 🌞 “O Sol escondido no céu”
- 👹 “O nascimento de monstros”
Essas histórias mostram de forma vívida e mitológica a origem do mundo, dos deuses e do Japão — muito mais do que um simples registro de fatos.
🌍 A Criação do Mundo e das Ilhas do Japão
(天地開闢・国産み神話)
No princípio, o universo era um caos indistinto, uma massa sem forma nem estrutura chamada ame-tsuchi (天と地 – céu e terra). Lentamente, os elementos começaram a se separar, e os deuses primordiais surgiram espontaneamente, sem pai nem mãe. Eles pertenciam ao que se chama de Kotoamatsukami (別天神) — os primeiros seres celestiais.
Entre as gerações seguintes de deuses estavam Izanagi no Mikoto (伊邪那岐命) e Izanami no Mikoto (伊邪那美命). Eles foram os últimos deuses gerados e os primeiros a receberem uma missão divina: criar a terra, moldar o arquipélago japonês — a grande nação de Ashihara-no-Nakatsukuni (葦原中国).
🔱 A Lança Celestial – Ame-no-Nuboko (天沼矛)
Para isso, os deuses superiores lhes entregaram a Ame-no-Nuboko (天沼矛), a Lança Celestial da Planície Alta do Céu. Ela foi forjada com poder divino, e seu nome pode ser interpretado como “lança do pântano celestial” ou “lança de bruma”, destacando sua origem mística.
Izanagi e Izanami subiram até a ponte flutuante do céu, chamada Ame-no-ukihashi (天の浮橋), de onde agitaram o mar primitivo com a ponta da lança. Quando a levantaram, gotas salgadas caíram e solidificaram-se, formando a primeira ilha:
🏝️ Onogoro-jima (自凝島) — literalmente, “a ilha que se coagula por si mesma”.
💑 A União dos Deuses: a simbologia do masculino e feminino
Após descerem até Onogoro-jima, Izanagi e Izanami construíram uma coluna central na ilha, chamada Ame-no-mihashira (天の御柱) — o Pilar Celestial.
Eles decidiram se unir em matrimônio, mas a união não foi imediata nem perfeita.
Na famosa cena de cortejo, Izanami fala primeiro:
「あなたはとても良い方です」
“Você é um homem encantador.”
Izanagi responde com palavras semelhantes. Eles então circundam a coluna, cada um de um lado, e se encontram para consumar a união.
Mas a primeira criança que nasce, chamada Hiruko (蛭子), nasce deformada e é abandonada ao mar. A segunda tentativa também fracassa. Izanagi, desconfiado, consulta os deuses celestiais (os Kotoamatsukami), que explicam o erro:
“Foi a mulher quem falou primeiro. A iniciativa deve vir do homem.”
Esse detalhe reflete a estrutura hierárquica de gênero da sociedade arcaica japonesa e sua influência nos ritos matrimoniais do xintoísmo.
Na terceira tentativa, com Izanagi tomando a iniciativa, a união é considerada adequada — e o processo de criação do Japão começa a dar certo.
🏝️ O Nascimento das Ilhas – Kuniumi (国生み)
A partir da união correta, Izanagi e Izanami geram as ilhas que formariam o arquipélago japonês. Essas ilhas são conhecidas como Ōyashima (大八島) – “As Oito Grandes Ilhas”.
As ilhas criadas foram:
- Awaji-shima (淡路島)
- Iyo-no-futana-shima (伊予之二名島) – hoje Shikoku
- Oki-no-shima (隠岐島)
- Tsukushi-no-shima (筑紫島) – hoje Kyushu
- Iki-no-shima (壱岐島)
- Tsushima (対馬島)
- Sado-no-shima (佐渡島)
- Ōyamatotsukushi (大倭豊秋津島) – hoje Honshu
🔍 Curiosidade:
Okinawa e Hokkaido não aparecem nesse processo porque, na época da formação mítica do Kojiki, essas regiões não faziam parte do território central do Japão como era concebido pelo império de Yamato.
- Okinawa estava cultural e politicamente ligada ao reino Ryukyu, com identidade distinta.
- Hokkaido era território dos povos Ainu, ainda fora do domínio e imaginário da corte imperial.
A sequência de criação das ilhas e os detalhes da união dos deuses refletem não apenas mitos cosmogônicos, mas também valores sociais e políticos do período. A ordem, a pureza ritual, a obediência à hierarquia e a função do masculino como iniciador são temas fundamentais que perpassam toda a mitologia do Kojiki.
🔥 Tragédia e o Mundo dos Mortos
(黄泉の国とイザナギの逃走)
Após gerar as ilhas do Japão, Izanami e Izanagi começam o processo de kamiumi (神産み) – o nascimento das divindades da natureza e dos elementos.
IzANAMI dá à luz a uma série de deuses, como:
- Ōkuninushi no Kami (大国主神) – em algumas interpretações, aparece mais adiante, mas sua linhagem tem início aqui
- Ōyamatsumi (大山津見神) – deus das montanhas
- Kayanohime (鹿屋野比売神) – deusa da vegetação
- Kuraokami (闇龗神) – deus da chuva e neblina
- Shinatsuhiko (志那都比古神) – deus do vento
- Watatsumi (綿津見神) – deus do mar
- Haniyasu-hime e Haniyasu-no-kami (埴安姫神・埴安神) – deuses da argila e da terra
- Kagutsuchi (迦具土神) – deus do fogo
🔥 Porém, ao dar à luz Kagutsuchi, o calor insuportável da chama divina queima gravemente Izanami por dentro, levando-a à morte. Com isso, o nascimento do fogo simboliza a primeira morte no mundo mitológico japonês — uma perda trágica e sagrada.
⚔️ O destino de Kagutsuchi
Desolado e furioso pela morte de sua amada, Izanagi empunha sua espada Totsuka-no-Tsurugi (十拳剣) e decapita Kagutsuchi.
Do sangue e do corpo desmembrado de Kagutsuchi nascem novas divindades, marcando a transição entre destruição e criação:
- Do sangue que escorre da espada:
- Iwasaku (磐裂神)
- Nesaku (根裂神)
- Ihatsutsunoo (磐筒男神)
- Ihatsutsunome (磐筒女神)
- Das partes do corpo:
- Kuraokami (闇龗神) – reforçando seu papel como deus da chuva
- Kuramitsuha (闇御津羽神) – deus da água corrente
Essa cena expressa o poder criativo do sangue e da morte, um tema recorrente no pensamento xintoísta.
💔 A jornada de Izanagi ao Yomi
Tomado pela dor, Izanagi decide ir atrás de sua esposa ao submundo para trazê-la de volta. Ao chegar, ele chama por ela:
「愛しき我が妻よ、共に帰ろう」
“Minha amada esposa, vamos juntos de volta.”
Izanami, surpresa e emocionada, responde:
「残念ながら、私はすでに黄泉の食べ物を食べてしまいました。」
“Infelizmente… eu já comi do alimento do Yomi.”
Ela continua:
「でも、あなたが来てくれてうれしい。私は黄泉の神々に相談してみます。その間、絶対に私を見ないでください。」
“Mas estou feliz por você ter vindo. Vou consultar os deuses daqui. Enquanto isso, não me olhe sob nenhuma circunstância.”
Izanagi promete, mas, impaciente, quebra a promessa. Ele acende um pente de seu cabelo como tocha e, à luz, vê Izanami em estado de decomposição, com vermes e oito deuses do trovão emergindo de seu corpo.
😱 O horror de Yomi: os oito deuses do trovão
Izanagi acende um pente de seu cabelo como tocha e entra no aposento escuro.
Lá, ele vê Izanami em estado avançado de decomposição: vermes rastejam, a carne está corrompida, e de seu corpo emergem oito deuses do trovão (雷神 – raijin), alojados em diferentes partes:
- Trovão da cabeça
- Trovão do peito
- Trovão da barriga
- Trovão das costas
- Trovão das mãos
- Trovão dos pés
- Trovão dos quadris
- Trovão do órgão sexual
Esses deuses representam forças naturais violentas, ligados à fúria da decomposição e à imprevisibilidade do mundo espiritual. A visão de Izanagi rompe a esperança de retorno de Izanami, que se transforma definitivamente em uma entidade de Yomi.
🏃♂️ A fuga de Izanagi e a perseguição espiritual
Enfurecida por ter sido vista, Izanami envia os yomotsu-shikome (黄泉醜女) – mulheres monstruosas do submundo – atrás dele, junto dos deuses do trovão.
Izanagi usa três itens de seu corpo para escapar:
- Cachos de uvas (葡萄) – distraem as perseguidoras
- Bambus trançados (蔓草) – criam obstáculos
- Pêssegos (桃) – arremessados no final, afastam os seres malignos
🍑 O pêssego (momo) simboliza pureza, renovação e proteção na mitologia japonesa — até hoje presente em rituais xintoístas como um fruto que afasta o mal.
Izanagi agradece à fruta, dizendo:
「お前は善き果実なり」
“Tu és um bom fruto.”
🚪 A separação entre vida e morte
Izanagi alcança a saída de Yomi e fecha a entrada com uma pedra colossal, chamada:
🪨 Chibiki-no-iwa (千引きの岩) – literalmente, “rocha que mil homens moveriam”.
Do outro lado da pedra, Izanami grita com raiva:
「愛しき夫よ、あなたの国の人々を一日千人、私は殺そう!」
“Meu amado marido, todos os dias mataria mil pessoas do seu país!”
Izanagi responde:
「ならば、私は一日に千五百の産屋を建てよう!」
“Então, todos os dias farei nascer mil e quinhentos!”
⚖️ Esse diálogo mítico é uma explicação simbólica para a existência da morte e do nascimento:
a inevitabilidade da morte, mas também o impulso contínuo da vida.
Essa cena marca a separação definitiva entre o mundo dos vivos e dos mortos, estabelecendo o limite espiritual entre pureza e impureza, entre harae (purificação) e a corrupção de Yomi — fundamentos essenciais no pensamento religioso e linguístico do Japão.
🌞 O Nascimento dos Três Nobres Filhos (三貴子の誕生)
(Amaterasu, Tsukuyomi e Susanoo)
Após a fuga desesperada do Yomi-no-Kuni e a separação definitiva de Izanami, Izanagi sentiu-se espiritualmente corrompido.
No xintoísmo, a morte é considerada uma das mais altas formas de impureza (穢れ – kegare), e por isso ele realizou um importante ritual de purificação (禊 – misogi).
Esse ritual ocorreu em um rio (geralmente identificado como o rio Tachibana (橘小門の阿波岐原), na atual província de Miyazaki). Ali, enquanto lavava partes de seu corpo, surgiram divindades de purificação, e também os três deuses mais importantes do panteão japonês: os Três Nobres Filhos (三貴子 – Sankishi).
🧼 De onde surgiram os três deuses?
Durante o ritual de misogi, os deuses nasceram especificamente das partes do rosto de Izanagi, conforme ele se lavava:
- Amaterasu (天照大神) – Deusa do Sol ☀️
👉 Nascida de seu olho esquerdo (左目)
É a divindade mais reverenciada do xintoísmo, símbolo da luz, ordem e soberania.
Representa a fonte de vida e a autoridade celestial que seria herdada pela família imperial japonesa. - Tsukuyomi (月読命) – Deus da Lua 🌙
👉 Nascido de seu olho direito (右目)
Deus misterioso e menos cultuado que os outros dois. Representa o ciclo do tempo, a noite e a frieza da observação. - Susanoo (須佐之男命) – Deus das Tempestades ⛈️
👉 Nascido de seu nariz (鼻)
Deus impetuoso e selvagem, ligado aos mares, às tempestades e à desordem. Apesar disso, também é um herói cultural, que mais tarde derrota monstros e participa da formação da civilização.
Esses três filhos de Izanagi passaram a representar os três domínios do universo:
- ☀️ Amaterasu → o Céu e o mundo da luz (Takama-no-Hara)
- 🌙 Tsukuyomi → a Noite e o Tempo
- 🌊 Susanoo → o Mar e a Terra, em seu aspecto caótico
Após o nascimento, Izanagi ficou profundamente satisfeito com Amaterasu e entregou-lhe o governo de Takama-no-Hara, a Planície Celestial.
Para Tsukuyomi, foi dado o domínio da noite e da Lua.
E a Susanoo, foi confiado o controle dos mares — embora ele recusasse seu destino, preferindo procurar a mãe falecida, Izanami, no Yomi.
Esse último desejo de Susanoo daria início à sua queda e expulsão do céu, marcando o próximo grande ciclo de conflitos na mitologia japonesa.
🧠 Curiosidade linguística:
O nome “Amaterasu” vem de “terasu” (照らす), que significa “brilhar, iluminar”, e é uma forma honrosa e arcaica do verbo.
Já Susanoo contém o sufixo honorífico “-no-o” (尊), que indica divindade nobre, mas seu nome pode ser interpretado como “aquele que provoca (ou enfrenta) os elementos”. que conecta os céus à Terra, e são considerados os ancestrais das linhagens imperiais e divinas.
Há uma relação direta e profunda entre o misogi (禊) realizado por Izanagi no Kojiki e a purificação com água (temizu 手水) que fazemos nos santuários xintoístas até hoje.
💧 Misogi e Temizuya: Uma Conexão Sagrada
🧼 Misogi (禊) – A purificação completa do corpo
No Kojiki, após Izanagi entrar em contato com o mundo dos mortos (Yomi-no-Kuni) e com a impureza da morte (穢れ – kegare), ele se banha no rio Tachibana, realizando o ritual de purificação total conhecido como misogi.
Esse banho sagrado:
- Remove a contaminação espiritual
- Restaura a pureza necessária para lidar com o mundo divino
- Origina deuses durante o processo (inclusive os Três Nobres Filhos)
👉 Esse momento marca o nascimento do conceito xintoísta de purificação através da água como caminho para restaurar a harmonia espiritual.
🚿 Temizu (手水) – A purificação parcial dos visitantes
Nos santuários xintoístas, há sempre uma temizuya (手水舎) – a fonte de água com conchas ou conchas de bambu (hishaku).
Ali, os visitantes realizam um ritual simples de purificação externa das mãos e da boca, chamado temizu.
Esse ato tem origem simbólica direta no misogi de Izanagi, embora em escala reduzida. Ele carrega o mesmo propósito:
- Remover a impureza (mesmo que cotidiana e simbólica)
- Preparar o corpo e o espírito para estar diante dos deuses (kami)
- Relembrar o mito fundador da pureza como valor sagrado
🧠 Curiosidade cultural e linguística
- A palavra “temizu” (手水) significa literalmente “água das mãos”
- A pronúncia e o ideograma são os mesmos usados na antiguidade para designar banhos rituais menores
- A estrutura temizuya é sempre posicionada antes do caminho principal do santuário (参道 – sandō), mostrando que ninguém deve entrar em um espaço sagrado sem se purificar primeiro
✨ Em resumo
A prática cotidiana de lavar as mãos e a boca em um santuário não é um gesto higiênico, mas um ato simbólico que revive o gesto arquetípico de Izanagi, purificando-se após seu confronto com a morte.
É um elo vivo entre a mitologia ancestral do Kojiki e a religiosidade moderna do Japão.
🌑 Amaterasu se Esconde na Caverna Celestial
(天岩戸隠れ – Ama-no-Iwato Kakure)
Após o nascimento dos Três Nobres Filhos, os deuses foram encarregados de governar diferentes domínios.
Amaterasu recebeu o céu, Tsukuyomi a noite, e Susanoo foi designado ao mar.
No entanto, Susanoo se recusa a cumprir sua missão. Obcecado pela saudade da mãe (Izanami), ele age de forma destrutiva e desrespeitosa, trazendo caos à Planície Celestial (Takama-no-Hara 高天原).
💢 Os atos de Susanoo que provocaram a crise
Susanoo, em fúria e rebeldia, comete uma série de ofensas contra Amaterasu:
- Arrasa campos de arroz cultivados pelos deuses
- Espalha excrementos nos salões sagrados
- Arremessa um potro celestial morto dentro do tear onde Amaterasu e suas servas teciam as vestes divinas – uma ofensa gravíssima.
Durante esse episódio, uma das deusas fiandeiras morre de choque e trauma.
Amaterasu, tomada de medo, tristeza e repulsa, decide se esconder na caverna celestial:
🕳️ A caverna – Ama-no-Iwato (天の岩戸)
A caverna em que Amaterasu se esconde é chamada de Ama-no-Iwato, que significa “a porta rochosa do céu”.
Ao entrar nela, ela fecha a entrada com uma grande pedra, e com isso, a luz desaparece do mundo.
🌍 Toda a Terra e o Céu mergulham em trevas totais, e caos, doenças e desordem se espalham por todos os reinos.
🛐 A reunião dos deuses e o plano para trazê-la de volta
Os oitenta deuses celestiais (八百万の神 – yaoyorozu no kami) se reúnem às margens do rio Amano-Yasukawara (天安河原) para encontrar uma solução.
Eles elaboram uma estratégia divina, teatral e ritualística para atrair Amaterasu de volta:
- Forjam um espelho sagrado (Yata no Kagami – 八咫鏡)
- Criam uma joia sagrada (Yasakani no Magatama – 八尺瓊勾玉)
- Decoram uma árvore sakaki (榊) com espelhos e joias como oferenda
- Colocam a deusa Ame-no-Uzume (天宇受売命) para dançar em frente à entrada da caverna
💃 A dança sensual de Ame-no-Uzume
Ame-no-Uzume, deusa da alegria e da arte, sobe em uma tábua virada, começa a dançar de forma rítmica e sensual, e gradualmente expõe seus seios e genitais.
Os deuses caem na gargalhada, batem palmas e fazem uma grande algazarra ritualística.
🧠 Essa dança tem conotações xamânicas e de fertilidade, e representa a inversão do caos pela alegria – o riso como força que dissipa as trevas.
🌟 A saída de Amaterasu e o retorno da luz
Curiosa com os risos e sons festivos vindos de fora, Amaterasu espreita pela abertura da caverna.
Nesse momento:
- O deus Ame-no-Tajikarao (天手力男神) — “o deus das mãos fortes” — puxa a deusa para fora
- Outro deus fecha a entrada com a pedra, impedindo seu retorno
Amaterasu se depara com seu reflexo no espelho, e ao ver sua própria luz, percebe sua importância. Ela finalmente aceita retornar ao céu.
✨ Significado simbólico
- O mito explica o ciclo do dia e da noite, e é uma das fundações do xintoísmo.
- A criação do espelho e da joia marca a origem de dois dos Três Tesouros Sagrados do Japão.
- A dança de Uzume mostra o papel da arte, do riso e da ritualidade feminina na restauração da ordem.
- O episódio reforça a ideia de que a luz (Amaterasu) é necessária para que o mundo continue – e que os deuses precisam agir juntos para manter o equilíbrio.
Esse mito é recriado em rituais xintoístas e danças sagradas até hoje, especialmente no santuário Amano-Iwato-jinja (天岩戸神社), em Miyazaki, que afirma ser o local da caverna original.
⚔️ Susanoo e a Serpente Yamata-no-Orochi (須佐之男命と八岐大蛇)
(A batalha do deus rebelde contra o caos monstruoso)
🌾 Susanoo e o Deus da Colheita – O Escândalo da Impureza
Após ser expulso de Takama-no-Hara por seus atos violentos contra Amaterasu e os deuses celestiais, Susanoo desce à terra como uma divindade banida, carregando consigo fúria, orgulho ferido e, também, fome.
Durante seu exílio errante, ele encontra um deus da agricultura e da fartura, cuja identidade varia nas fontes — às vezes chamado de Ōgetsuhime-no-Kami (大宜都比売神) no Nihon Shoki (a versão complementar ao Kojiki) ou associado a outras entidades da colheita.
🍚 O banquete oferecido — e o insulto descoberto
Susanoo pede comida, e o deus ou deusa da colheita prontamente prepara um banquete:
- Grãos cozidos
- Frutas
- Peixes
- Alimentos de todas as estações
Porém, Susanoo observa algo estranho.
Desconfiado da origem da comida, ele investiga e descobre que os alimentos foram criados a partir dos orifícios do corpo da deidade:
- Arroz do ânus
- Peixes da boca
- Legumes do nariz
Esses alimentos foram gerados de forma simbólica, ritualística e sagrada, representando o ato criativo da natureza — o corpo divino como matriz de fertilidade.
Mas Susanoo, dominado pela raiva e repulsa, vê nisso uma afronta.
🔪 O assassinato da deusa
Enfurecido com o que considera um insulto impuro, Susanoo mata a deidade da colheita imediatamente.
De seu corpo morto, então, novas plantas brotam:
- Da cabeça: seda (蚕)
- Dos olhos: arroz
- Dos ouvidos: painço (milho miúdo)
- Do nariz: feijão
- Dos genitais: trigo
- Do ânus: soja
🌱 Significado simbólico
Este episódio expressa algo profundo na cosmologia xintoísta:
- A morte pode ser origem de fertilidade
- O corpo divino é gerador de vida — mesmo em sua decomposição
- A impureza (穢れ – kegare), ao ser transformada corretamente, pode se tornar nutrição e bênção
Ironicamente, mesmo matando a deusa, Susanoo involuntariamente ajuda a disseminar a agricultura no mundo humano.
🧠 Curiosidade adicional
- Esse mito é um protótipo xintoísta da relação cíclica entre vida, morte e alimentação.
- As plantações mais essenciais do Japão surgem aqui, ligando a alimentação diretamente ao corpo dos deuses.
- A produção de alimentos a partir dos orifícios também ecoa um conceito ritual muito presente na Ásia antiga: a sacralidade do corpo como microcosmo da terra.
Esse episódio antecede a redenção de Susanoo na luta contra Yamata-no-Orochi e mostra que, mesmo em seus atos mais destrutivos, ele participa da criação e transformação do mundo — um deus ambíguo, ao mesmo tempo necessário e perigoso.
🏞️ Encontro com a família em perigo
Ao chegar às terras próximas ao rio Hi (肥の川, na atual província de Shimane), Susanoo encontra um casal de anciãos chorando, Ashinazuchi (足名椎) e Tenazuchi (手名椎), acompanhados de sua filha, a jovem e bela Kushinada-hime (櫛名田比売).
Eles revelam o motivo de sua tristeza: uma terrível serpente de oito cabeças e oito caudas, chamada Yamata-no-Orochi (八岐大蛇), aparece todos os anos para devorar uma de suas filhas. Já perderam sete — Kushinada é a última.
🐍 A descrição de Yamata-no-Orochi
A serpente é descrita de maneira grotesca e mística:
- O corpo tem oito cabeças e oito caudas
- Tão longo que cobre oito vales e oito montanhas
- Seu corpo é coberto por musgo, cipós e árvores
- Os olhos brilham como lanternas flamejantes
- Dentro dele flui veneno e sangue como rios
Esse monstro representa o caos primitivo, natural e destrutivo, desafiando a ordem celestial.
💡 O plano de Susanoo
Susanoo propõe salvar Kushinada em troca de sua mão em casamento.
O casal aceita, e ele elabora um plano engenhoso:
- Transforma Kushinada-hime em um pente (櫛) e a coloca em seu cabelo — escondendo-a dos olhos da serpente.
- Pede que construam oito portões e oito plataformas em linha.
- Em cada uma, coloca um barril de sakê fortíssimo, conhecido como Yashiori-no-sake (八塩折の酒).
Atraída pelo cheiro, cada cabeça da serpente bebe avidamente o sakê, embriagando-se profundamente.
⚔️ A batalha contra Orochi
Com a serpente embriagada e indefesa, Susanoo saca sua espada e corta ferozmente cada uma das cabeças e caudas. O sangue escorre e inunda os arredores.
Ao fatiar uma das caudas centrais, sua espada bate em algo duro. Ele encontra dentro da serpente um objeto extraordinário:
🗡️ O achado da Espada Sagrada – Kusanagi-no-Tsurugi (草薙の剣)
Dentro do corpo da Orochi, Susanoo descobre a espada celestial que mais tarde receberá o nome de:
Kusanagi-no-Tsurugi (草薙の剣) – “Espada Cortadora de Grama”
Essa espada é considerada um dos Três Tesouros Sagrados do Japão (三種の神器 – Sanshu no Jingi), junto do espelho de Amaterasu (Yata no Kagami) e da joia sagrada (Yasakani no Magatama).
🔁 Susanoo oferece essa espada como presente de reconciliação para Amaterasu, como forma de pedir perdão por seus atos passados.
💍 Casamento e fundação mítica
Após a vitória, Susanoo cumpre sua promessa e se casa com Kushinada-hime.
Ele também estabelece seu palácio na terra de Izumo, sendo considerado o fundador divino da cultura dessa região.
🧠 Curiosidades e significados simbólicos
- A batalha é vista como a transição do caos para a ordem, do instinto bruto para a civilização.
- A espada Kusanagi representa poder, coragem e legitimidade imperial.
- Kushinada-hime simboliza a fertilidade, o feminino domesticado e a aliança entre divindade e humanidade.
Este mito não só marca a redenção de Susanoo, como também enraíza a autoridade divina da linhagem imperial japonesa por meio dos tesouros celestiais que surgem diretamente da superação do caos.
🏯 A Disputa pelo Poder na Terra – A Rendição de Ōkuninushi (国譲り神話)
(O momento em que a Terra é entregue à linhagem celestial)
Com o mundo dos deuses em ordem após o nascimento dos Três Nobres Filhos, os olhares se voltam para o reino terrestre, chamado Ashihara-no-Nakatsukuni (葦原中国) — o “País do Meio dos Juncos”, ou seja, o Japão.
Esse mundo estava sob o domínio de Ōkuninushi no Kami (大国主神), um deus descendente de Susanoo, que havia pacificado e organizado a Terra com sabedoria e auxílio divino.
Ōkuninushi é conhecido por:
- Ter criado o país (国づくり kunizukuri)
- Ter vencido disputas entre irmãos
- Ter recebido orientação direta de Susanoo durante provações
- Ser o deus das conexões (縁結び), saúde e prosperidade
⚖️ A missão celestial: transferir o poder
O plano divino, porém, era que a descendência de Amaterasu, a deusa do Sol, herdasse o governo da Terra.
Para isso, Amaterasu envia diversos mensageiros — conhecidos como Tenson-shi (天孫使) — para pedir que Ōkuninushi ceda o reino pacificamente.
Inicialmente, há resistência. Ōkuninushi consulta seus filhos, especialmente Kotoshironushi (事代主神), que concorda em entregar o poder.
Outro filho, Takeminakata (建御名方神), resiste, mas é derrotado em combate pelo emissário celestial Takemikazuchi no Kami (建御雷神), deus do trovão e da guerra.
🛕 A rendição e os termos do acordo
Após os eventos, Ōkuninushi aceita entregar o governo da Terra sob a seguinte condição:
Que lhe seja construído um grande templo onde possa ser venerado para sempre.
Os deuses celestiais concordam, e é prometida a construção de um santuário em sua homenagem.
🏯 Esse santuário é o Izumo Taisha (出雲大社), um dos mais antigos e sagrados do Japão, localizado na atual província de Shimane.
Até hoje, é um local central para cultos de ligação amorosa, destino e harmonia espiritual.
🤝 Simbolismo e importância do mito
O episódio é conhecido como “Kuni-yuzuri” (国譲り) – a entrega da terra.
Ele carrega significados políticos e espirituais profundos:
- Justifica a autoridade imperial como ordenada por Amaterasu
- Integra a linhagem de Susanoo e seus descendentes à narrativa nacional
- Representa um modelo ideal de transição pacífica de poder, por meio de negociação, honra e reconhecimento mútuo
🧠 Curiosidade adicional
- Ōkuninushi, apesar de abrir mão do governo, nunca foi considerado derrotado.
- Ele é reverenciado como kami que protege o povo, enquanto a linhagem de Amaterasu governa.
- Sua história mostra que, na visão mitológica japonesa, autoridade política e espiritual não são excludentes, mas complementares.
Essa transição encerra o ciclo de criação do mundo e prepara a descida celestial do neto de Amaterasu, que inaugurará a linhagem dos imperadores humanos.
🌎 A Descida Celestial e o Início da Linhagem Imperial
(天孫降臨 – Tenson Kōrin)
Com a Terra (葦原中国 – Ashihara-no-Nakatsukuni) pacificada e o poder transferido por Ōkuninushi, o plano divino de Amaterasu para estabelecer uma linhagem celestial entre os humanos finalmente avança.
Amaterasu, junto com os deuses do Céu, decide enviar seu neto Ninigi-no-Mikoto (邇邇芸命), filho de Ame-no-Oshihomimi, como mensageiro e governante da Terra.
🛤️ A descida – Tenson Kōrin (天孫降臨)
Ninigi desce do céu acompanhado por vários deuses guardiões (como Ame-no-Koyane, Futodama, Uzume e Ishikoridome) até a região de Takachiho (高千穂), nas montanhas da atual província de Miyazaki, em Kyushu.
Este evento é conhecido como “Tenson Kōrin”, literalmente, “a descida do neto do Céu”.
👑 Os Três Tesouros Sagrados (三種の神器 – Sanshu no Jingi)
Ao descer, Ninigi leva consigo os símbolos celestiais da autoridade divina que legitimam seu governo na Terra:
- 🔆 Espelho – Yata no Kagami (八咫鏡)
Representa sabedoria e verdade.
Foi usado por Amaterasu para sair da caverna e reflete a divindade dentro do imperador.
➤ Simboliza a clareza de visão e justiça. - 🔱 Espada – Kusanagi-no-Tsurugi (草薙の剣)
Descoberta por Susanoo ao derrotar Yamata-no-Orochi.
Representa bravura, força e proteção.
➤ É a arma espiritual do imperador. - 💎 Joia – Yasakani no Magatama (八尺瓊勾玉)
Um colar curvo em forma de vírgula, símbolo de benevolência, harmonia e continuidade espiritual.
➤ Representa o laço entre os deuses e o povo.
Estes tesouros são até hoje considerados símbolos do trono imperial do Japão, embora raramente exibidos publicamente.
🏔️ A fundação da linhagem imperial
Em Takachiho, Ninigi casa-se com Konohana-Sakuya-Hime (木花咲耶姫), deusa das flores, símbolo da vida efêmera.
Essa união dá início a uma linhagem semi-divina, que irá reger o Japão.
Dessa linhagem, após várias gerações, nasce Kamu-Yamato-Iware-Biko (神倭伊波礼毘古命), que mais tarde será conhecido como:
👑 Jinmu Tennō (神武天皇) – o primeiro imperador humano do Japão.
🧠 Significado profundo
- A descida de Ninigi marca o início da sacralização da autoridade política no Japão.
- Os Três Tesouros não são apenas objetos — são pilares ideológicos:
Sabedoria (espelho), força (espada) e compaixão (joia) - O imperador japonês passa a ser visto como descendente direto dos deuses, especialmente de Amaterasu
Essa origem mitológica sustenta, até os dias atuais, o conceito de “tennō” (天皇) – o soberano celestial.
👑 A Base da Autoridade Imperial
Segundo o Kojiki, o poder do imperador não vem apenas de seu domínio humano, mas da linhagem divina que remonta aos deuses do céu.
Esse volume é, portanto, uma fundamentação espiritual e política do trono imperial japonês — que, segundo a tradição, permanece ininterrupto até os dias atuais.
📖 Resumo dos Capítulos – Kojiki Volume Superior (上巻のあらすじ)
1. Prefácio (序文)
📝 Introdução sobre o contexto da criação do Kojiki, a pedido do imperador Tenmu, para preservar corretamente a história do Japão.
2. Aparição dos Deuses (神々の出現)
✨ No caos primordial, surgem os primeiros deuses que passam a organizar o céu e a terra. Eles são chamados de kami e formam a base do panteão xintoísta.
3. Nascimento da Ilha Onogoro (オノゴロ島の誕生)
🌊 Os deuses criadores, Izanagi e Izanami, usam uma lança celestial para agitar o mar. As gotas que caem da lança formam Onogoro-jima, a primeira ilha.
4. Casamento de Izanagi e Izanami (イザナキとイザナミの結婚)
💍 Eles se casam em Onogoro-jima e iniciam a criação das outras ilhas do arquipélago japonês e dos deuses da natureza.
5. Morte de Izanami (イザナミの死)
🔥 Izanami morre ao dar à luz o deus do fogo, Kagutsuchi. Sua morte marca o início do ciclo de vida e morte na mitologia japonesa.
6. Viagem ao Yomi, o mundo dos mortos (黄泉の国めぐり)
💀 Izanagi desce ao mundo dos mortos (Yomi) para resgatar Izanami, mas ao ver sua forma apodrecida, foge horrorizado e sela o mundo dos mortos.
7. Nascimento dos Três Nobres Filhos (三貴子の誕生と分治)
☀️🌙🌊 Durante um ritual de purificação, Izanagi gera:
- Amaterasu, deusa do Sol
- Tsukuyomi, deus da Lua
- Susanoo, deus das tempestades
Eles governariam os três domínios: céu, noite e mar.
8. O juramento entre Amaterasu e Susanoo (アマテラスとスサノオの誓約)
🤝 Para provar sua lealdade, Susanoo faz um juramento com Amaterasu. Eles trocam espadas e jóias, gerando novos deuses.
9. Amaterasu se esconde na caverna celestial (天の岩屋隠れ)
🌑 Após atos violentos de Susanoo, Amaterasu se esconde, mergulhando o mundo em trevas.
Os deuses fazem uma festa para atraí-la de volta, trazendo de novo a luz ao mundo.
10. A morte do deus dos grãos (穀物の神の死)
🌾 Susanoo mata o deus dos grãos em um acesso de fúria, sendo por isso expulso do Céu.
11. Susanoo derrota Yamata no Orochi (スサノオの八俣大蛇退治)
🐍 Na Terra, Susanoo derrota a serpente de oito cabeças Yamata-no-Orochi e resgata Kushinada-hime, com quem se casa.
💎 Ele encontra a lendária espada Kusanagi, um dos Três Tesouros Sagrados.
12. O casamento de Ōanamuchi (因幡の白兎)
🐇 Ōanamuchi (outro nome para Ōkuninushi) ajuda um coelho ferido, que o apresenta à princesa Yagami. Essa história é uma das mais famosas do folclore japonês.
13. Fuga para a terra de Ne no Kuni (根の堅州国への逃亡)
🏃♂️ Perseguido por seus irmãos, Ōkuninushi foge para o mundo subterrâneo, Ne no Kuni, uma espécie de mundo espiritual.
14. Provações de Susanoo (スサノオの試練)
🧠 Susanoo impõe tarefas difíceis a Ōkuninushi, que as supera com inteligência e coragem.
15. O ciúme de Suseri-hime (スセリビメの嫉妬)
💔 Mesmo após se casar com a filha de Susanoo, Suseri-hime, Ōkuninushi sofre com seu ciúme obsessivo.
16. Criação da terra por Ōkuninushi (オオクニヌシの国づくり)
🏗️ Com a ajuda do deus Sukunabikona, Ōkuninushi organiza e desenvolve o mundo humano.
17. A entrega do país por Ōkuninushi (オオクニヌシの国譲り)
🎌 Ōkuninushi concorda em entregar o governo da Terra aos descendentes de Amaterasu em troca de reconhecimento divino e templos em sua honra.
18. Descida celestial do neto (天孫降臨)
🌟 O neto de Amaterasu, Ninigi-no-Mikoto, desce à Terra levando os Três Tesouros Sagrados:
Espelho, Espada e Joia – símbolos da autoridade imperial.
19. Ame-no-Uzume e Sarutahiko (アメノウズメとサルタヒコ)
💃 A deusa Ame-no-Uzume guia Ninigi na Terra, sendo recebida por Sarutahiko, um deus guardião, que o conduz com segurança.
20. Casamento com Konohana-Sakuya-Hime (コノハナサクヤビメとの結婚)
🌸 Ninigi se casa com Konohana-Sakuya-Hime, símbolo da beleza efêmera, mas rejeita sua irmã, Iwanaga-hime, o que explicaria a mortalidade humana.
21. Umisachihiko e Yamasachihiko (ウミサチビコとヤマサチビコ)
⚓ Uma fábula sobre os irmãos: o pescador (Umisachihiko) e o caçador (Yamasachihiko). O caçador triunfa após muitos desafios e recebe bênçãos divinas.
22. Nascimento de Kamu-Yamato-Iware-Biko (カムヤマトイワレビコの誕生)
👶 Yamasachihiko casa-se com a filha do deus do mar e, de sua linhagem, nasce Kamu-Yamato-Iware-Biko, que mais tarde se tornará Imperador Jinmu, o primeiro imperador humano do Japão.
📘 Kojiki – Volume do Meio (中巻)
🏯 A Humanidade Entra em Cena
👑 Nascimento do Imperador Jinmu – O Primeiro Imperador
Neste volume, o foco se volta do mundo dos deuses para o mundo humano.
A história passa a acompanhar Kamu-Yamato-Iware-Biko, descendente de Ninigi-no-Mikoto, enviado dos céus por Amaterasu para governar a Terra. Ele se tornaria mais tarde conhecido como o Imperador Jinmu (神武天皇).
⛰️ Inicialmente, sua linhagem divina se estabelece na região de Kyushu.
Porém, Kamu-Yamato-Iware-Biko decide mudar a sede do governo para Yamato, região considerada mais propícia para a unificação do país.
⚔️ Durante sua jornada, enfrenta muitos desafios, incluindo a morte de seu irmão em batalha. Mesmo assim, consegue atravessar o mar de Kii e finalmente chega a Yamato, onde funda o império japonês e torna-se seu primeiro imperador.
🧠 Curiosidade: A fundação do Japão por Jinmu é comemorada até hoje no feriado nacional chamado Kenkoku Kinen no Hi (建国記念の日), no dia 11 de fevereiro.
⚔️ Yamato Takeru – O Herói Trágico
Yamato Takeru (ヤマトタケル), filho do 12º imperador Keikō, é um dos personagens mais lendários do Kojiki.
🗡️ Enviado para diversas expedições militares, seu papel era pacificar regiões rebeldes.
Para vencer seus inimigos, disfarça-se de mulher, infiltra-se entre eles e os derrota com astúcia e bravura.
🌸 Após conquistar o oeste, parte para o leste do Japão.
No entanto, em sua última missão, adoece e morre antes de retornar à capital.
Seu espírito é reverenciado como um kami (deus), símbolo de coragem e sacrifício.
🧠 Curiosidade: Diz-se que após sua morte, ele se transformou em um pássaro branco, cujos voos marcaram locais de culto a ele.
🛡️ Consolidação do Poder Imperial e a Sucessão
Após Jinmu, os imperadores seguintes continuaram a expandir e fortalecer o império.
👑 O imperador Sujin foi essencial para organizar o governo e os rituais religiosos, unificando os deuses locais sob um sistema imperial.
📜 As histórias sobre Ōmononushi e Ōkuninushi continuam, agora em contexto humano, servindo como base mitológica para legitimar o trono imperial.
⚔️ Campanhas e Sucessão até o Imperador Ōjin
Durante o reinado do 14º imperador, Chūai, sua consorte Imperatriz Jingū (神功皇后) assume o comando após a morte do marido.
⚔️ Ela lidera uma expedição militar até a península da Coreia, obedecendo a uma ordem espiritual dos deuses.
🤰 Após retornar ao Japão, dá à luz Homutawake, que mais tarde se torna o 16º imperador, Ōjin (応神天皇).
🛡️ O imperador Ōjin é tão venerado que foi deificado como Hachiman (八幡神), o deus da guerra, cultuado por samurais por séculos.
📘 Resumo dos Capítulos – Kojiki Volume do Meio (中巻のあらすじ)
1. Expedição de Kamu-Yamato-Iware-Biko (カムヤマトイワレビコの東征)
⚔️ Kamu-Yamato-Iware-Biko parte com seu irmão Itsuse-no-Mikoto para conquistar o leste e fundar o novo governo imperial.
2. Morte de Itsuse (イツセの死)
🏹 Itsuse é atingido por uma flecha envenenada em batalha. Antes de morrer, aconselha mudar a rota da expedição, considerando desfavorável lutar de frente contra o leste, onde nasce o sol.
3. Orientação do pássaro Yatagarasu (八咫烏の導き)
🐦 Um corvo de três patas enviado pelos deuses, Yatagarasu, guia o grupo até a região de Yamato, simbolizando o apoio divino à missão imperial.
4. Perigo no palácio de Uda (宇陀での危機)
⚠️ Ao chegarem ao palácio de Uda, Iware-Biko e seus seguidores são alvo de uma emboscada. Conseguem escapar e continuar a campanha.
5. Nascimento do Imperador Jinmu (神武天皇の誕生)
👑 Após derrotar os inimigos e consolidar seu domínio em Yamato, Iware-Biko é entronizado como o primeiro imperador do Japão, recebendo o nome de Jinmu.
6. Casamento com Isukeyori-Hime (イスケヨリヒメとの結婚)
💍 O imperador Jinmu casa-se com Isukeyori-Hime, filha do deus Ōmononushi, fortalecendo os laços entre os deuses locais e a nova casa imperial.
7. Do 2º ao 11º Imperador (第2代天皇から第11代天皇)
📜 Relatos da sucessão de imperadores, conflitos e alianças políticas até o reinado do 11º imperador. A casa imperial vai consolidando seu poder e expandindo sua influência.
8. 12º Imperador Keikō (第12代景行天皇)
👑 Keikō assume o trono e envia seu filho Ōsu, que mais tarde será conhecido como Yamato Takeru, para missões de pacificação militar.
9. Expedição de Ōsu (オウスの西征)
🗡️ Ōsu derrota os inimigos na região oeste e recebe o nome de Yamato Takeru, tornando-se um herói nacional.
10. Derrota de Izumo-Takeru (イズモタケルの討伐)
⚔️ Durante sua jornada de volta, Yamato Takeru elimina Izumo-Takeru, outro guerreiro poderoso, garantindo controle sobre mais territórios.
11. Expedição oriental de Yamato Takeru (ヤマトタケルの東征)
🌄 Ele é enviado para conquistar as regiões do leste. Enfrenta perigos extremos, mas usa astúcia e força para completar sua missão.
12. Colapso de Yamato Takeru (ヤマトタケルの崩御)
😔 Durante o retorno, Yamato Takeru adoece gravemente e morre.
🕊️ Seu espírito se torna divino e é associado a um pássaro branco que sobrevoa os céus — símbolo de sua ascensão ao status de kami.
13. Coroação do 13º Imperador (第13代成務天皇)
👑 Um meio-irmão de Yamato Takeru sobe ao trono como o 13º imperador, continuando a linhagem e reorganizando o governo local.
14. 14º Imperador Chūai (第14代仲哀天皇)
⚠️ Seu reinado é marcado por dúvidas em relação à orientação divina. Ele hesita em obedecer aos deuses e morre repentinamente.
15. Expedição de Jingu à Coreia (神功皇后の新羅遠征)
⚔️ Após a morte de Chūai, sua esposa Imperatriz Jingu lidera uma expedição à península da Coreia, supostamente inspirada por revelações divinas.
🪙 Diz-se que ela conquistou Silla sem lutar, apenas com a autoridade dos deuses.
16. Rebelião de Oshikuma (オシクマノミコの反乱)
⚔️ Durante o retorno da expedição, Jingu enfrenta uma rebelião interna liderada por Oshikuma, mas a derrota com astúcia e apoio espiritual.
17. Viagem misteriosa de Hondawake (ホンダワケの謎の旅)
🚶♂️ O príncipe Hondawake, filho de Jingu, realiza uma jornada simbólica e espiritual antes de assumir o trono, demonstrando seu destino divino.
18. Coroação do 15º Imperador Ōjin (第15代応神天皇の即位)
👑 Hondawake é coroado como Imperador Ōjin, venerado mais tarde como Hachiman, o deus da guerra.
19. Disputa entre os três príncipes (三皇子の分掌)
👦👦👦 Ōjin divide os territórios entre seus três filhos. Um deles é escolhido como seu herdeiro direto, estabelecendo as bases da próxima sucessão.
20. Conflito pela sucessão imperial (皇位継承の争い)
⚔️ O príncipe Oyamamori tenta usurpar o trono, mas é derrotado. Ōasazuma se torna o 16º imperador, mantendo a continuidade da linhagem.
21. Contos curtos (小話)
📚 Pequenos episódios e lendas paralelas aparecem, incluindo histórias com Ame-no-Uzume, oferecendo alívio cômico, sabedoria e aspectos culturais do cotidiano mitológico.
📘 Kojiki – Volume Inferior (下巻)
🏯 Conflitos familiares e a sucessão imperial como história
O volume inferior do Kojiki se destaca por seu caráter histórico e genealógico, diferentemente dos volumes anteriores, mais focados em mitologia e fundação divina.
📜 Ele registra, com detalhes, os imperadores do 17º ao 33º, oferecendo um retrato complexo da transição entre o mundo lendário e os primeiros registros históricos do Japão.
🧬 A Cronologia Imperial em Foco
Este volume funciona como uma genealogia oficial da casa imperial, detalhando:
- Ascensões e sucessões
- Casamentos estratégicos
- Intrigas palacianas
- Disputas políticas e familiares
🧠 Embora seja uma fonte “oficial”, o texto não esconde escândalos, mortes suspeitas e rivalidades internas. Pelo contrário, expõe como os próprios descendentes divinos enfrentavam desafios humanos.
⚔️ Conflitos e Escândalos da Corte Imperial
💥 Diversos episódios relatados mostram que a sucessão ao trono era tudo menos pacífica. Entre eles:
- Assassinatos e traições
- Disputas entre irmãos e primos
- Intervenções de imperatrizes e príncipes ambiciosos
- Tensões religiosas e culturais com a chegada do budismo
👑 Exemplos Marcantes
- 20º Imperador Ankan (安閑天皇)
Teve um reinado curto e instável. Seu irmão o sucedeu como o 21º imperador Senka (宣化天皇). - 22º Imperador Kinmei (欽明天皇)
Governou durante um período de grande transformação cultural, quando o budismo foi introduzido no Japão.
Isso gerou forte resistência entre facções tradicionais, abrindo novos conflitos religiosos e políticos. - 23º Imperador Kōgyoku (皇極天皇)
Primeira mulher a governar com o título imperial. Após uma crise, cede temporariamente o trono, mas retorna depois com o nome de Imperatriz Saimei (斉明天皇). - 24º Imperador Tenji (天智天皇)
Filho de Kōgyoku, governa com foco em reformas administrativas e centralização do poder. - 25º Imperador Tenmu (天武天皇)
Irmão de Tenji, assume o trono após a famosa Rebelião de Jinshin (壬申の乱).
É um dos imperadores mais poderosos e promoveu a compilação do próprio Kojiki.
🔗 Estabilização da Linha Imperial
A partir do reinado de Tenmu, observa-se um esforço para estabilizar o poder imperial, culminando com os registros até o 33º imperador, Jomei (舒明天皇).
📚 Os relatos finais do volume são mais objetivos e resumidos, com foco na manutenção da linhagem imperial, mas ainda reconhecem que a autoridade divina não impediu lutas pelo trono.
⚖️ O Peso Político e Humano da História
Apesar da origem divina atribuída aos imperadores, o Kojiki revela que:
- A vida palaciana era repleta de disputas e dramas familiares
- As decisões da elite afetavam profundamente o povo e a estabilidade do país
- O Japão começava a se formar como um estado estruturado, mas ainda fortemente baseado em linhagens e alianças
Este volume mostra que a divindade imperial não excluía o lado humano do poder: ambição, perda, rivalidade, reformas e transformação espiritual.
📘 Resumo dos Capítulos – Kojiki Volume Inferior (下巻のあらすじ)
1. 16º Imperador Nintoku (仁徳天皇)
🤝 Conhecido como o “imperador piedoso”, Nintoku viu a pobreza do povo e suspendeu a cobrança de impostos por três anos.
👫 Também é relatado que teve conflitos conjugais com sua esposa Iwanohime, provocados por ciúmes, o que mostra um lado humano e pessoal da figura imperial.
2. Do 17º ao 18º Imperador (第17代〜第18代天皇)
⚔️ Após a morte do 17º imperador Richū, eclodiram disputas sucessórias.
O trono acabou sendo assumido pelo 18º imperador Hanzei, refletindo as instabilidades da linhagem nessa fase.
3. Romance de Karunomiko (カルノミコの恋愛)
❤️ Após a morte do 19º imperador Ingyō, o príncipe Karunomiko é acusado de adultério com Sashiyori, a quem amava.
❌ Por causa do escândalo, seu irmão foi coroado como o 20º imperador Ankō, marcando uma sucessão cercada de intrigas.
4. Revolta de Mayowanomiko (マヨワノミコの変)
🔪 Mayowanomiko assassina seu tio, o imperador Ankō, para vingar a morte de seu pai.
☠️ No entanto, acaba derrotado por Hoshikawa, que o captura e o executa.
📉 Uma sucessão marcada por vingança e violência familiar.
5. Fuga do filho de Ichinohe-no-Oshihanomiko (イチノヘノオシハノミコの子の逃亡)
🏃♂️ Como era potencial herdeiro, o filho de Ichinohe-no-Oshihanomiko se tornou alvo político e precisou fugir para sobreviver.
6. 21º Imperador Yūryaku (第21代雄略天皇)
🐗 Yūryaku ficou conhecido por seu governo autoritário e comportamentos polêmicos.
Durante uma caçada, perseguiu e matou um cervo — um ato simbólico que o teria levado a assumir o trono.
👑 Foi um governante temido, mas decisivo para a centralização do poder.
7. 22º Imperador Seinei (第22代清寧天皇)
🧬 Filho de Yūryaku, Seinei não teve filhos próprios.
Ele nomeou como herdeiros os filhos de sua tia, garantindo a continuidade da linhagem imperial por meio da linha colateral de Ōhatsuse-no-Wakatake.
8. Do 23º ao 24º Imperador (第23代〜第24代天皇)
🛡️ Os filhos de Oshihano-no-Miko, anteriormente fugitivos, são reencontrados.
👑 O mais novo torna-se o 23º imperador Kenzō, e o mais velho, posteriormente, é reconhecido como o 24º imperador Ninken.
9. Do 25º ao 33º Imperador (第25代〜第33代天皇)
📚 A narrativa torna-se mais concisa e resumida.
A partir do 25º imperador, o texto se concentra em linhagens e genealogias básicas até o reinado da 33ª soberana, a Imperatriz Suiko (推古天皇), a primeira mulher oficialmente reconhecida como imperatriz reinante.
🧠 Esse trecho mostra a transição do relato mitológico para um registro político e histórico, reforçando a continuidade da autoridade imperial, mesmo em meio a conflitos e rupturas.
🌏 Visão de Mundo do Kojiki (古事記の世界観)
Uma cosmologia vertical conectando deuses, humanos e mortos
Segundo o Kojiki, o universo é estruturado em três grandes planos verticais, que formam a base da cosmologia japonesa mitológica. Esses mundos coexistem, influenciando-se mutuamente e refletindo a ligação sagrada entre o Céu e a Terra, especialmente no contexto da linhagem imperial.
☁️ 1. Takama-no-Hara (高天の原) – A Planície Celestial
- É o reino dos deuses (kami), um plano elevado e etéreo, inacessível aos humanos.
- Amaterasu, a deusa do Sol, reina soberana neste plano.
- É neste local que os deuses debatem e decidem os destinos do mundo mortal.
🧠 Curiosidade:
Takama-no-Hara é como uma “corte celestial”, espelhando a estrutura política da Terra.
O envio de Ninigi-no-Mikoto à Terra partiu daqui — um ato que reforça a autoridade divina da família imperial japonesa.
🌾 2. Ashihara-no-Nakatsukuni (葦原の中つ国) – A Terra do Meio
- É o mundo dos humanos, moldado por Izanagi e Izanami, os deuses criadores.
- Também é o palco onde deuses interagem com humanos e intervêm no destino da nação.
- Inicialmente pacificado por Ōkuninushi, depois foi entregue à linhagem de Amaterasu, através de negociações divinas.
🗾 Identificado com o Japão, é onde ocorre a história dos imperadores e dos heróis mitológicos.
🧠 Curiosidade:
O nome significa “a terra entre os juncos” — um reflexo da paisagem original do arquipélago japonês, repleto de campos alagados.
⚫ 3. Yomi-no-Kuni (黄泉の国) – O Mundo dos Mortos
- Governado por Izanami após sua morte.
- É descrito como sombrio, impuro e repleto de decomposição.
- Uma vez que se entra nesse mundo, não se pode mais retornar ao dos vivos — exceto no caso mitológico de Izanagi.
🧟 Izanagi desce até Yomi para resgatar Izanami, mas ao ver sua forma corrompida, foge apavorado, selando a fronteira entre vida e morte.
🧠 Curiosidade:
Essa história é uma das primeiras representações japonesas da morte como ruptura definitiva, influenciando práticas de purificação no xintoísmo.
🌌 Outros Mundos Mencionados no Kojiki
🕳️ Ne-no-Katasukuni (根の堅州国)
- Um mundo profundo e misterioso, associado aos mortos ou ao subsolo.
- É onde Susanoo vive após ser banido do Céu.
- Às vezes confundido com Yomi, mas é mais uma terra longínqua do que um reino da morte.
🏝️ Tokoyo-no-Kuni (常世の国)
- Um paraíso eterno além dos mares, onde habita o deus Sukuna-hikona.
- É considerado um mundo imortal e, às vezes, um tipo de pós-vida idealizada.
🧠 Curiosidade:
Em alguns textos, é associado ao mundo dos deuses ou ao “reino sem mudança” — um contraponto positivo a Yomi.
🌙 Yoru-no-Osukuni (夜の食国)
- Nomeado como “O País da Alimentação Noturna”, governado por Tsukuyomi, deus da Lua.
- Representa o lado noturno e misterioso do sustento e, simbolicamente, pode refletir um reino da quietude e contemplação.
🌊 Umi-hara (海原) – O Reino do Oceano
- O mundo do mar, domínio natural de muitos deuses e criaturas.
- Susanoo é enviado para lá antes de ser exilado.
🧠 Curiosidade:
As águas são vistas como fronteiras entre mundos, funcionando como portais entre a Terra, o Céu e o Submundo.
🗺️ Estrutura Vertical do Universo no Kojiki
☁️ Takama-no-Hara (Céu dos Deuses)
↓
🌾 Ashihara-no-Nakatsukuni (Terra dos Humanos)
↓
⚫ Yomi-no-Kuni (Submundo dos Mortos)
Essa estrutura vertical é fundamental para entender o mundo do Kojiki:
- Os deuses estão acima, observando e intervindo.
- Os humanos habitam o centro, onde o drama da história ocorre.
- Os mortos permanecem abaixo, em um reino silencioso e irreversível.
🌸 Essa visão cosmológica reforça a ideia de que o Japão é um país abençoado pela ordem celestial, governado por descendentes diretos dos deuses, e ligado espiritualmente a todos os planos da existência.
🈶 Kojiki e o Idioma Japonês – Curiosidades e Conexões Linguísticas
🗣️ Uso dos kanji de forma híbrida: som e significado
O Kojiki foi escrito utilizando caracteres chineses (kanji) de duas maneiras diferentes:
- Fonética (借音 – shakuyin): kanji usados apenas pelo som, sem se preocupar com o significado original.
- Semântica (借義 – shakyō): kanji usados pelo significado.
Esse sistema de escrita híbrido, anterior ao uso dos kana (hiragana e katakana), mostra uma fase de transição na língua japonesa, quando ainda não havia um alfabeto fonético próprio.
Essa técnica é conhecida como man’yōgana (万葉仮名), e teve papel fundamental na formação do sistema silábico japonês moderno.
📖 Registro do japonês arcaico (上代日本語 – jōdai nihongo)
O Kojiki é uma das principais fontes do japonês do período Nara, também chamado de japonês arcaico. O texto preserva:
- Formas verbais antigas, muitas já desaparecidas
- Partículas com funções diferentes das que conhecemos hoje
- Vocabulário original, com palavras que mudaram de sentido ou caíram em desuso
A estrutura frasal, uso de auxiliares e escolha lexical revelam um idioma em processo de consolidação, com forte influência da oralidade ritual e poética.
🎵 Origem da poesia japonesa clássica
O Kojiki contém vários trechos em forma de waka (和歌) — poemas que seguem a métrica de 31 sílabas (5-7-5-7-7). Esses são considerados os precursores formais do tanka e da tradição poética registrada posteriormente no Manyōshū.
Neles já aparecem elementos como:
- Makurakotoba (枕詞) – epítetos fixos que introduzem imagens poéticas
- Kakekotoba (掛詞) – palavras com duplo sentido ou trocadilhos fonéticos
Essa tradição poética está diretamente ligada à forma oral e cerimonial de expressão, própria de uma sociedade ritualística.
🉐 Primeiros registros de palavras e expressões ainda usadas
Muitas palavras do Kojiki têm continuidade no vocabulário moderno, com poucos ou nenhum ajuste semântico.
Exemplos incluem:
- 「まこと」 (makoto) – sinceridade, verdade
- 「うつつ」 (utsutsu) – realidade, oposto de sonho
- 「こころ」 (kokoro) – coração, mente, espírito
Além disso, expressões como 「ひととなり」 (hitotonari), que indicam caráter ou personalidade, aparecem com conotações semelhantes às atuais.
🏯 Traços linguísticos regionais e diversidade dialetal
O Kojiki registra mitos e histórias de várias regiões do Japão, como Izumo, Yamato, Kyushu, entre outras. Em algumas narrativas, há traços lexicais ou fonológicos locais, sugerindo que os dialetos japoneses já estavam em formação mesmo no século VIII.
Essa diversidade aparece, por exemplo, em palavras específicas para divindades, locais ou ações cerimoniais que diferem entre regiões.
📜 Função ritual e estilo narrativo
A linguagem do Kojiki não era apenas informativa — ela tinha função religiosa, política e estética.
O estilo é marcado por:
- Paralelismos e repetições para facilitar a memorização oral
- Ritmo narrativo cerimonial, próprio de recitação sagrada
- Vocabulário solene, voltado à reverência aos deuses e à linhagem imperial
Esse uso ritual da linguagem consolidou uma estética que influenciou profundamente a literatura clássica japonesa e os registros históricos posteriores.
O Kojiki é, portanto, não só um alicerce mitológico do Japão, mas também um dos marcos mais antigos e ricos na formação e registro da língua japonesa, oferecendo um retrato vivo de como o idioma evoluiu em som, forma e função.
📜 O Japão Pré-Kanji: Uma Cultura Oral
🕰 Contexto Histórico
Antes da introdução dos kanji, que ocorreu por volta do século V d.C., o Japão não possuía um sistema de escrita próprio. O idioma japonês era totalmente oral, e a sociedade era organizada em clãs tribais (uji) com sistemas de crença e cultura próprios. Era uma sociedade agrária, com forte ênfase em laços familiares, mitos e rituais.
👄 Como as Informações Eram Transmitidas
1. Tradição Oral
O conhecimento era passado de geração para geração por meio da fala, incluindo:
- Histórias e mitos (como os que depois formariam o Kojiki e o Nihon Shoki)
- Rituais religiosos e cerimônias xintoístas
- Práticas agrícolas e costumes sociais
- Genealogias e registros de liderança de clãs
Pessoas mais velhas (anciãos, líderes espirituais ou chefes de clãs) eram consideradas as detentoras do saber, e o aprendizado ocorria através da memorização, observação direta e repetição.
2. Música e Poesia
A poesia e o canto eram formas comuns de memorizar e ensinar informações. Era mais fácil lembrar versos ritmados do que simples frases faladas.
- Isso pode ter sido o embrião do que mais tarde se tornaria a tradição poética japonesa (waka, tanka etc.).
🏫 Como Era o Ensino
Não havia “escolas” no sentido moderno da palavra. A educação acontecia:
- Dentro da família ou do clã
- Por meio de instrução prática (como plantio, caça, rituais)
- Através de ritos de passagem (ensinando o papel de cada pessoa na sociedade)
Líderes espirituais ou religiosos ensinavam as práticas religiosas, e os chefes de clãs instruíam os jovens sobre seu papel na sociedade e na guerra.
🈶 Chegada dos Kanji: A Revolução
Com o contato com a China e a Coreia (especialmente o reino de Baekje), os japoneses começaram a importar a escrita chinesa — os kanji — por volta do século V.
- Monjes budistas coreanos e chineses desempenharam um papel fundamental na introdução da escrita.
- A princípio, os kanji eram usados para escrever em chinês clássico, e só depois foram adaptados ao japonês nativo, criando-se o sistema man’yōgana (que usava kanji foneticamente).
A partir daí, o Japão passou a registrar suas histórias (Kojiki, Nihon Shoki), leis (Ritsuryō), e expandir a educação formal, especialmente nos mosteiros budistas e, mais tarde, nas cortes imperiais.
✅ Resumo
Antes dos kanji, o Japão era uma sociedade oral, onde:
- O conhecimento era transmitido verbalmente.
- A educação era prática e comunitária.
- A cultura e história eram preservadas por mitos, rituais, e poesia falada.
- Não havia sistema de escrita nativo, nem “escolas” formais como conhecemos hoje.
A chegada dos kanji transformou profundamente a maneira como o Japão registrava e transmitia conhecimento.
🏯 1. Origem dos Samurais — Século VIII ao X
🏹 Período Nara (710–794) e Heian (794–1185)
- A palavra “samurai” (侍) vem do verbo saburau (servir, estar à disposição).
- Inicialmente, samurai não era uma classe distinta, mas um termo genérico para aqueles que serviam à nobreza da corte imperial, especialmente em funções militares ou de guarda pessoal.
Com o tempo, os aristocratas começaram a formar forças armadas privadas, compostas por guerreiros especializados. Isso aconteceu porque o governo central enfraqueceu, e os conflitos locais entre clãs e por terras aumentaram.
🛡️ Esses guerreiros locais se tornaram cada vez mais poderosos — e assim começou a formação da classe guerreira samurai.
⚔️ 2. Consolidação — Século X ao XII
🏇 O Clã Minamoto e o Clã Taira
Durante o final do período Heian, duas grandes famílias guerreiras (Minamoto e Taira) travaram várias guerras pelo controle do Japão.
- A vitória dos Minamoto na Guerra Genpei (1180–1185) levou à fundação do shogunato Kamakura (1185), sob Minamoto no Yoritomo.
- Ele estabeleceu um governo militar paralelo à corte imperial, e os samurais tornaram-se a classe dominante do Japão feudal.
Nesse momento, o samurai passou de servo militar a classe social e política estruturada.
🗡️ 3. A Katana e Outras Armas
⚔️ Evolução da Espada Samurai:
- Antes do século XIV, os samurais usavam principalmente espadas retas (chokutō) e arcos (yumi).
- Com o tempo, surgiu a tachi, uma espada curva usada com a lâmina voltada para baixo.
- Por volta do século XIV, a katana evoluiu da tachi, com uma lâmina mais curta e curva, ideal para combate corpo a corpo e saque rápido.
🈶 A katana se tornou símbolo do espírito do samurai — não apenas uma arma, mas uma extensão da alma do guerreiro.
🛡️ 4. Armaduras Samurai
Tipos de Armadura:
- A primeira armadura japonesa típica era o ō-yoroi (大鎧) — pesada, feita para guerreiros montados.
- Depois, surgiu o dō-maru (胴丸), mais leve e flexível, usada por infantaria.
- As armaduras eram feitas com placas de ferro e couro laqueadas, amarradas com cordas de seda ou couro. Tinham proteção para cabeça (kabuto), ombros, tronco e pernas.
Durante o período Sengoku (séculos XV–XVI), com o aumento das guerras civis, surgiram armaduras mais práticas, como a tosei gusoku, que protegiam melhor contra armas de fogo (introduzidas pelos portugueses).
🎖️ 5. A Profissão Samurai
Ser samurai não era apenas lutar. Era um modo de vida:
- Código de conduta: o famoso Bushidō (caminho do guerreiro), que valorizava lealdade, honra, coragem e autocontrole.
- Os samurais serviam a um senhor feudal (daimyō), protegendo suas terras e executando funções administrativas e judiciais.
- O treinamento incluía combate, estratégia, literatura, caligrafia, e ética.
Com o tempo, o samurai se tornou também um modelo ideal de cidadão, respeitado tanto pela espada quanto pelo caráter.
🧨 6. Declínio dos Samurais
Após a unificação do Japão sob o shogunato Tokugawa (1603–1868), houve paz prolongada (período Edo), e os samurais passaram a ser burocratas e administradores, não mais guerreiros ativos.
Com a Restauração Meiji (1868):